Para muitos, moda é sinônimo de luxo e inacessibilidade, algo que não está presente no dia a dia. Mas a moda está presente desde o momento que acordamos e nos vestimos para trabalhar até o pijama que usamos para dormir. E no futebol não poderia ser diferente. As marcas esportivas e os times estão em trabalho constante para criar produtos novos para os torcedores, principalmente camisas em edições limitadas. Essa engrenagem movimenta milhões e é um dos braços da grande indústria esportiva.

Vem entender!

Giphy/Adidas/Nike/Puma/Umbro/Divulgação

O que entendemos atualmente como o uniforme dos jogadores de futebol surgiu da necessidade de diferenciar os times, principalmente quando foi permitida a presença de público nos estádios. Segundo artigo de Regina Sanches, Cláudia Vicentini e Silgia da Costa, professoras de Têxtil e Moda da Universidade de São Paulo (USP), os ingleses usavam, por volta de 1860, um traje “constituído de uma calça usada para dentro de meiões, camisa de botão e terninho esportivo, botas de cano médio com travas e touca para proteger a cabeça da costura da bola”. 

Porém, a indústria de artigos esportivos, tal qual conhecemos hoje, começou a ganhar corpo apenas na década de 1950, quando a alemã Adidas lançou os primeiros pares da chuteira Samba, modelo que segue até hoje no portfólio da marca. A Nike também teve o start com uma chuteira, a The Nike. Em 1978, a empresa norte-americana assinou um contrato para fornecer material esportivo ao time profissional de Portland, cidade do estado do Oregon, nos Estados Unidos.

Já a relação da Nike com o nosso país começou em 1994, quando Phil Knight, fundador da marca, assumiu publicamente que estava interessado em patrocinar a Seleção Brasileira. O anúncio aconteceu dois dias após o Brasil vencer a Itália nos pênaltis e conquistar o quarto título em uma Copa do Mundo. Foi também na década de 1990 que a Nike revolucionou a indústria esportiva ao desenvolver o Dri-FIT, tecido que absorve e elimina o suor mais rápido.

As professoras da USP destacaram no trabalho sobre os tecidos utilizados nos uniformes que, na Copa do Mundo de 2010, a Seleção Brasileira de futebol usou “camisas confeccionadas a partir da reciclagem de garrafas PET, aliando tecnologia, sustentabilidade e maior conforto aos atletas”. O tecido foi uma “evolução do sistema Nike Dri-FIT”, porque era mais leve e permitia uma passagem de ar 7% maior em relação ao das camisas anteriores.

Rei George V, da Inglaterra, cumprimentando o Manchester City antes de uma partida, em 1915

 

Os uniformes de futebol começaram a ficar como os que conhecemos hoje no século 20

 

A Adidas continua reinventando a Samba, a primeira chuteira da marca alemã

 

Design aprimorado

No que tange o design das camisas, Gustavo Viana, diretor de marketing da FISIA, a distribuidora oficial da Nike do Brasil, explica à coluna que o processo de criação é uma via de mão dupla. “A Nike conhece a história de cada clube/seleção e trabalha muito próximo dos departamentos de marketing e comunicação no desenvolvimento das camisas, desta forma, existe confiança para que o design seja inovador e continue de acordo com os valores do time”.

Segundo o diretor, o sucesso da camisa de 2018 da seleção da Nigéria foi um marco para a Nike. Gustavo aponta que, desde então, a marca embarcou “em uma imersão cultural profunda” e passou a colaborar “com cada clube/seleção para entregar conceitos criativos que personificam cada time e representem cada país”.

A coluna questionou Gustavo Viana sobre o balanço de vendas para entender o impacto das vestimentas esportivas no mercado. O diretor de marketing argumenta que a Nike não divulga números, mas cita como exemplo a camisa roxa do Corinthians, lançada em setembro de 2021. O item, que tinha estampada a frase “Respeita as Minas”, foi desenvolvido “em homenagem às mulheres corinthianas, que representam 53% da torcida” e atualmente restam poucas unidades no e-commerce. “O resultado é uma identificação cada vez maior dos torcedores com os uniformes”, assegura.

A Nike trabalha atualmente para interseccionar cada vez mais moda e esporte e ditar tendências no streetwear. “É sob essa ótica que nós, por meio de pesquisas com jovens torcedores, jornalistas, artistas, influenciadores e atletas parceiros, identificamos as características que eles buscam e implementamos em nossas camisas, tornando-as peças-chave que possam transitar em diversos ambientes”, explica Gustavo Viana.

O jogador nigeriano Alex Iwobi em campo
O jogador Alex Iwobi com a camisa da Nike de 2018 celebrava a estreia da Nigéria no mundial de 1994

 

Camisa do Corinthians
A camisa com a frase “Respeita as Minas” foi inspirada no uniforme oficial do Corinthians

 

Jogadores do Corinthians com novo uniforme
A campanha que apresenta o novo uniforme do Corinthians foi estrelada pelas jogadoras do time feminino

 

 

Ações que engajam

O sucesso dos artigos esportivos e, principalmente, das camisas oficiais, está justamente na relação dos clubes com as torcidas. Uma prova concreta foi a campanha O Manto da Massa, do Atlético Mineiro, em parceria com a marca francesa Le Coq, patrocinadora do time em 2020. Os torcedores deveriam enviar sugestões de design para “o manto” e o time escolheria 13 finalistas. O vencedor seria selecionado pela plateia e 50% do valor arrecadado com as vendas do item seria doado para o combate à pandemia de Covid-19.

Segundo o Galo, em 24 horas o concurso acumulou mais de 25 mil votos. O vencedor foi o atleticano Flávio Markiewickz, de Belo Horizonte, que desenvolveu uma camisa minimalista com as clássicas listras do time em um design mais retrô. A ação fez tanto sucesso que foram vendidas, em uma semana, mais de 100 mil unidades do modelo final. Em 2021, teve dobradinha e o Atlético Mineiro convocou novamente os torcedores a enviarem suas ideias.

O campeão foi o divinopolitano Lucas Adriano de Sousa que, segundo o time, “recebeu aproximadamente 14 mil, dos mais de 57 mil votos válidos”. A febre dos artigos em NFT não poderia passar despercebida pelos aficionados em futebol e em raridades relacionadas ao esporte. Em parceria com a CollectID e a Sportheca, o Manto da Massa que celebra os 113 do Galo vem com uma “smart tag“, uma espécie de chip junto à etiqueta que torna a camisa única e atesta sua originalidade.

Camisa do Atlético Mineiro
A primeira ação do Galo tinha caráter solidário e era um convite de participação da torcida

 

Camisa do Atlético Mineiro
O Galo resolveu repetir a ação em 2021 por causa do sucesso com a torcida

 

Camisa do Atlético Mineiro
A novidade da campanha de 2021 é que os torcedores que comprarem a camisa ganham também uma versão da peça em NFT

Artigo de colecionador

O paulista Rodrigo Dutra Vianna não é torcedor do Galo – “sou corinthiano maloqueiro e sofredor” –, mas faz parte de um time forte: o dos colecionadores de artigos esportivos. À coluna, estima que sua coleção deve ter, atualmente, mais de 1.000 peças.

“Eu calculo um número entre 750 camisas, mais ou menos, de muitos clubes. São mais de 120 do Corinthians, 150 da Champions League, 60 de Copa do Mundo e beirando 200 de seleções internacionais”. Isso sem contar as  30 bolas de torneios, que são organizadas com as datas das partidas, e os quase 170 pares de chuteiras.

Vianna afirma que a relação com o futebol vem desde a barriga da sua mãe. “Nasci em uma família que gostava muito de futebol: meu irmão jogava, meu pai foi jogador de base do Coritiba”, conta. Ele também começou a praticar cedo e jogou por muitos anos no time de Pinheiros, além de ter tido uma breve passagem pela base do São Paulo.

E foram justamente as amizades que fez durante os anos em campo que o instigaram a iniciar a coleção de itens esportivos. “Comecei a colecionar em 2000, quando o Moraci Santana estava no Corinthians e me dava camisas que trocava com outros jogadores. A partir dali, as coisas começaram a fluir… Foi um caminho sem volta”.

Homem branco com camisa do Messi
Rodrigo Vianna é um colecionador de camisetas de time e de artigos diversos de futebol, como bolas e chuteiras. Sua coleção conta com mais de 1.000 itens atualmente

 

Rodrigo Vianna passou o amor pelos itens para o filho Fernando, de 7 anos, que já possui coleção própria com peças autografadas

 

Camisa e chuteira do goleiro Taffarel
Itens raros do goleiro Taffarel, um dos tesouros da coleção de Rodrigo Vianna

Indagado pela coluna se poderia escolher alguma peça “xodó”, Rodrigo Dutra Vianna destaca duas. “Em 2006, fui assistir a Copa do Mundo na Alemanha e, quando passei na concentração para pegar o ingresso do jogo do Brasil contra a Austrália, o Moraci e o Parreira me deram um presente: uma sacolinha simples com uma chuteira do Ronaldo”.

O outro item selecionado foi na verdade um combo: a chuteira e a camisa usada por Cláudio Taffarel na final da Copa do Mundo da França, em 1998. “O melhor que vi jogar – uma opinião pessoal”, garante. Segundo Vianna, objetos pessoais de Taffarel são raríssimos de encontrar. 

Rodrigo Vianna acredita que continuará com a prática até o fim da vida. Como a coleção do filho Fernando, de 7 anos, já deu seus primeiros passos, o legado deve ser passado de pai para filho. O colecionador disse à coluna que ainda tem o sonho de alguns itens raros, como uma camisa do Pelé. Enquanto aficionados por futebol seguirem com seus acervos, de grande ou pequeno porte, a relação entre moda e o esporte só será reforçada.


Colaborou Carina Benedetti


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